Operações irregulares causa a condenação de corretora de valores em mais de 1.3 milhões

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Operações irregulares causa a condenação de corretora de valores em mais de 1.3 milhões

 

A juíza Cláudia Aparecida Coimbra Alves, da 11ª Vara Cível de Belo Horizonte, condenou a empresa Corval Corretora de Valores Mobiliários S.A. a indenizar em R$1.304.641,10 um cliente que alegou ter sofrido prejuízos com operações irregulares e não autorizadas de aplicação financeira no mercado de ações da bolsa de valores.



O cliente ajuizou a ação contra a corretora alegando ser cliente investidor desde 2010, quando firmou um contrato de prestação de serviços para aplicações financeiras no mercado de ações da Bolsa de Valores, para que a empresa comprasse e vendesse ações no mercado financeiro. De acordo com ele, as operações deveriam ser autorizadas por escrito, via e-mail ou mensagens eletrônicas.



Também afirmou que a corretora deveria sempre operar com um limite máximo diário de aplicações, que não foram respeitados, o que culminou em várias operações sem autorização, e muito acima do limite estabelecido pela própria empresa, conforme os relatórios financeiros.



As operações fora dos parâmetros estabelecidos visaram, segundo o cliente, a obtenção de comissões mais altas, mas levaram à perda de valores que originalmente entregou para a corretora. Ele acusou operadores da empresa de cometer erros que tiveram como consequência a negativação da sua conta de investimentos por um longo período.



O cliente afirmou também que, tentando minimizar a situação, a corretora enviou-lhe demonstrativos com declarações equivocadas de resultados do Imposto de Renda Pessoa Física, pois informavam lucros nas operações, quando na realidade a conta estava negativa.



Alegou que tentou, por diversas vezes, resolver a situação, e que em maio de 2013 o novo diretor operacional da empresa lhe informou que sua conta de investimento fora suspensa em razão do saldo negativo. Na ocasião, o diretor informou que estava ciente do ocorrido, que a corretora realmente havia cometido um erro operacional, que a sua reivindicação era justa, mas que tal situação só poderia ser resolvida judicialmente.



Uma empresa terceirizada foi contratada pela corretora e apurou que o investidor teria de ter em sua conta de investimento, durante o período analisado, R$2.231.07,89, devendo ser acrescentadas a esse valor as operações day trade, conforme demonstrativos anuais, no valor de R$451.337,60. Do total de R$2.682.645,49, contudo, a corretora depositou em espécie R$1.865.040, no período de janeiro de 2010 a maio de 2013.



Desse total depositado na conta de investimento, o cliente disse ter recuperado R$581.055,49, devendo a corretora devolver-lhe R$1.283,984,60. Ele pretendia ainda receber R$20.664,50, cobrados como “despesas financeiras sobre ressarcimentos atrasados”, valor com o qual não concorda, porque não foi ele que gerou os débitos, mas a empresa.


Em sua defesa a corretora alegou que o investidor assinou o contrato com a empresa classificando seu perfil de investidor como “agressivo”, ou seja, estava habilitado e habituado a realizar negócios extremamente arriscados, com probabilidade de ganhos ou perdas em grande escala.



Afirmou que, desde janeiro de 2010, o requerente depositou valores para aplicações a serem efetuadas por ele mesmo, através do home broker, e por ordens enviadas aos operadores da corretora.


Alegou que durante anos o requerente depositou em sua conta, de forma aleatória, valores variados, o que considerou demonstrar que o investidor estava de acordo e satisfeito com as ações intermediadas pela corretora.



De acordo com a corretora, qualquer compra ou venda de ações era acompanhada de autorização, por e-mail ou por chat (conversas eletrônicas) e também por ligação telefônica. Justificou ainda que no final de 2011 o requerente parou de depositar valores em sua conta, tendo feito uma última transferência de R$370.000.



A corretora afirmou que naquela ocasião a conta dele encontra-se positiva, apesar de algumas perdas pela variação do mercado de ações, especialmente nas ações de sua preferência. Atribuiu as perdas que o cliente sofreu aos seus investimentos de alto risco, bem como à queda pública e notória das ações da Vale e da Petrobrás. A corretora também questionou o fato de o cliente não ter apresentado reclamação à BSM, empresa que é ligada a Bovespa supervisiona o mercado de ações.



Depois de verificar a documentação anexada ao processo, incluindo transcrições dos diálogos entre o investidor e os operadores da empresa, tendo inclusive ouvido alguns dos áudios, a juíza Cláudia Aparecida Coimbra concluiu que a corretora praticou ilícito contratual, devendo a empresa restituir-lhe R$1.283.984,60. Considerou também devida a quantia de R$20.664,50, já que o investidor não deu causa ao saldo negativo de sua conta. Mas considerou que não procedia o pedido de ressarcimento do imposto de renda, R$ 120.000.



A magistrada observou que é obrigação do investidor recolher imposto de renda sobre seus ganhos, porém, analisando os documentos, verificou que não houve ganho no período. Além disso, o investidor não apresentou suas declarações de renda para comprovar que tenha recolhido o valor como imposto de renda. A decisão foi publicada no último dia 21 de março.


Leia a íntegra de decisão:

Autos nº 0024.13.265.319-7
Ação Monitoria
Requerente: B.V.C.O.
Requerida: Corretora de Valores Imobiliários S/A – CORVAL
Vistos, etc.


B.V.C.O. ajuizou ação monitória em face de Corretora de Valores Imobiliários S/A – CORVAL, ambos qualificados na inicial, alegando, em apertado resumo, ser cliente investidor da requerida desde 2010, quando firmou um contrato de prestação de serviços para aplicações financeiras no Mercado de Ações da Bolsa de Valores, para que esta realizasse, mediante autorização por escrito via e-mail e chat/MSN, a compra e venda de ações no mercado financeiro.



Esclareceu que existiam “*REGRAS OPERACIONAIS + LIMITE DE CRÉDITO + CUSTÓDIA” para as operações da requerida, conforme explicitou às fls. 03/06, ressaltando que os resumos de extratos revelam que requerida deveria sempre operar com um limite máximo diário de aplicações (compra/venda), que não foram respeitados, o que culminou em várias operações sem autorização, e muito acima do limite estabelecido pela requerida, conforme definido nos relatórios financeiros.


Sustentou que a requerida, apesar das orientações emitidas por escrito pelo autor para realização das operações sem a sua autorização operou grandes volumes de opções de ações, fora dos parâmetros estabelecidos, sem a devida trava de segurança visando a obtenção de comissões mais altas, o que acarretou a perda de valores que originalmente entregou para a requerida.



Disse que a requerida, através de seus operadores, cometeu erros operacionais, executando operações sem sua autorização, o que acarretou na negativação da sua conta de investimentos por um longo período, o que é proibido pelo Banco Central, pois caracteriza financiamento de cliente.



Obtemperou que a requerida, tentando minimizar a situação, enviou-lhe demonstrativos com declarações equivocadas de resultados do IRPF, que não condiziam com a realidade dos fatos, ou seja, informavam lucros nas operações, quando na realidade a conta estava negativa.


Alegou que tentou, por diversas vezes, resolver a situação; contudo em maio de 2013, houve troca do diretor operacional da empresa ré, sendo-lhe informado de a sua conta de investimento foi suspensa em razão de saldo negativo; que ele estava ciente do ocorrido, que a corretora realmente havia cometido um erro operacional, que a sua reivindicação era justa, mas que tal situação só poderia ser resolvida judicialmente.

Dissertou sobre as ações incorretamente realizadas pela requerida e não autorizadas; contudo, continuou com as operações de investimentos com a requerida, diante das promessas desta em providenciar o ressarcimento dos prejuízos sofridos.



Aduziu que, além das operações irregulares, sem autorização, foi percebido, também, lançamentos indevidos e sendo cobrados em dobro, conforme pode ser visto da nota de corretagem nº 13638/10, no valor de R$86.965,34 (oitenta e seis mil, novecentos e sessenta e cinco reais e trinta e quatro centavos); outro lançamento indevido chamado “Tomada de Devolução de Margem” no valor de R$271.231,04 (duzentos e setenta e um mil, duzentos e trinta e um reais e quatro centavos), evaporou da sua conta, após a revisão de lançamentos.



Registrou que, além dos valores informados nas quatro operações fora da margem determinada (travas) e não autorizadas, descobertas anteriormente, constatou, após receber os demonstrativos anuais do IRPF realizados por empresa terceirizada outros inúmeros prejuízos ocasionados por operações sem autorização, que constam dos documentos anexos.



Acrescentou que as operações irregulares culminaram em um valor estimado de R$120.000,00 (cento e vinte mil reais), valor este que requer seu reembolso, uma vez que está arcando com tal valor perante a Receita Federal, por culpa exclusiva da requerida.



Asseverou que no decorrer das operações realizadas pela requerida e não autorizadas, a requerida cobrou a quantia de R$20.664,54 (vinte mil, seiscentos e sessenta e quatro reais e cinquenta e quatro centavos), de “despesas financeiras sobre ressarcimentos atrasados”, que o requerente não concorda, porque não gerou os débitos, sendo que foi a requerida quem as criou, e desde já pleiteia sua integral devolução.



Discorreu sobre o cabimento da presente ação monitória, pedindo a aplicação do CDC.



Informou que, conforme apurado por empresa terceirizada a contratada pela requerida, o autor teria que ter em sua conta a quantia de R$2.231.07,89 (dois milhões, duzentos e trinta e um mil, sete reais e oitenta e nove centavos), devendo ser acrescentado a este valor, as operações DAY TRADE, conforme demonstrativos anuais, no valor de R$451.337,60 (quatrocentos e cinquenta e um reais, trezentos e trinta e sete reais e sessenta centavos), perfazendo o total de R$2.682.645,49 (dois milhões, seiscentos e oitenta e dois mil, seiscentos e quarenta e cinco reais e quarenta e nove centavos); contudo, depositou em espécie a quantia de R$1.865.040,00 (um milhão, oitocentos e sessenta e cinco mil e quarenta reais), no período compreendido entre janeiro de 2010 e maio de 2013.


Da quantia depositada em espécie, disse ter recuperado o montante de R$581.055,49 (quinhentos e oitenta e um mil, cinquenta e cinco reais e quarenta e nove centavos), devendo a requerida devolver-lhe a quantia de R$1.283,984,60 (um milhão, duzentos e oitenta e três mil, novecentos e oitenta e quatro reais e sessenta centavos), deve a requerida ainda, ressarcir-lhe a quantia de R$20.664,50 (vinte mil, seiscentos e sessenta e quatro reais e cinquenta centavos).



Ao final, a parte autora requereu a condenação da requerida no montante de R$1.424.649,10 (um milhão, quatrocentos e vinte e quatro reais, seiscentos e quarenta e nove reais e dez centavos), acrescida de correção monetária e dos juros leais desde os seus respectivos vencimentos, até efetivo pagamento. Pediu seja invertido o ônus da prova e a condenação da requerida nos ônus da sucumbência.



Juntou os documentos de fls. 25/1665.



Custas recolhidas à fl. 1669.



Despacho inicial à fl. 1670.



Documentos juntados pela autora às fls. 51/65



A parte requerida foi citada e apresentou embargos às fls. 11719689/.



Sustentou, em síntese, que as partes firmaram contrato de prestação de serviços imobiliários, sendo respondido pelo requerente ao questionário padrão que seu perfil de investimentos era “agressivo”, ou seja, estava habilitado e habituado a realizar negócio extremamente arriscados, com probabilidade de ganhos ou perdas em grande escala.



Informou que, a partir de janeiro de 2010, o requerente depositou valores em sua conta corrente aberta junto à contestante para aplicações a serem efetuadas por ele mesmo, através do “home broker”, e por ordens enviadas aos operadores da corretora, a partir disso, o conjunto de compras de ações, como vendas, compras a venda geravam um relatório diário denominado “nota de corretagem”.



Alegou que durante anos o requerente depositou em sua conta, de forma aleatória, valores variáveis e pelo que se percebe estando de acordo e satisfeito com as ações intermediadas pela corretora, pois, caso contrário, teria cessado suas operações, ou reclamado de algo que supostamente foi realizado sem sua permissão ou até mesmo mudado seu perfil de investidor; desta forma não se entende qual o motivo da reclamação do autor, pois todas as operações eram realizadas no mesmo padrão de tisco, conforme orientações, autorizações e até mesmo de acordo com o que cliente sempre solicitava, operações de alto risco.



Sustentou que qualquer compra ou venda de ações e opções, pressente ou futura, eram acompanhadas de autorização, por e-mail ou por chat/msn ou, ainda, por ligação telefônica, conforme documentos anexos.



Dissertou sobre as alterações de alto risco.



Afirmou que no final de 2011, o requerente parou de depositar valores em sua conta, tendo transferido o último valor, na quantia de R$370.000,00 (trezentos e setenta mil reais), em 21/11/11 ocasião em que sua conta encontra-se positiva, apesar de algumas perdas pela variação do mercado de ações, especialmente nas ações de sua preferência e após este último depósito o requerente continuou a atuar no mercado; no entanto, sofreu mais perdas do que ganhos, como já ocorria nos primeiros anos, em virtude de seus investimentos serem de alto risco, em sua maioria, bem como a queda pública e notória das ações da Vale e Petrobrás.



Ressaltou que o requerente teve plena consciência de todas as operações que foram realizadas, uma vez que quando necessário, concedeu sua concordância e autorizações, o que pode ser comprovado através das gravações e cópias de autorizações SKYPE e chat/MSN apresentadas.


Refutou o pedido de restituição de valores relativos ao IRPF.



Alegou, em preliminares, a ausência de interesse de agir e a inépcia da inicial.


No mérito, sustentou que o requerente não apresentou reclamação perante a BSM, porque seria efetuada uma análise apurada de seu histórico no mercado de capital e a BSM chegaria à conclusão de que seu perfil agressivo lhe conduziu a perdas significativas no mercado de ações, decorrentes, justamente, de seu arrojo.



Afirmou que os documentos apresentados pelo requerente no anexo V são, verdadeiramente, um espelho de todas as retenções na fonte exigidas por Lei e pela Receita Federal, pelo que resta sem fundamento a acusação do autor de que a ré teria distorcido e manipulado a realidade dos investimentos do requerente.


Refutou o dano material pretendido, impugnando os documentos apresentados pelo requerente.



Sustentou que o requerente atuou em flagrante má-fé, haja vista a alteração da verdade dos fatos, estando cinte de que o único causador dos danos foi o mesmo.



Pugnou, ao final, pela extinção da ação (com o acolhimento das preliminares), senão pela improcedência dos pedidos iniciais, declarando a inexistência dos supostos danos alegados pelo autor; a condenação do autor no pagamento dos ônus da sucumbência (observando-se o valor econômico envolvido na causa), a condenação do autor nas penas da litigância de má-fé de 1%, calculada sobre o valor da causa, mais indenização de 20%, também sobre o valor da causa.



Juntou os documentos de fls. 1720/2807.



Impugnação à fl. 2811/2827.



Intimadas as partes para especificação de provas, à fl. 2828 o requerente manifestou-se às fls. 2829/2830, pleiteando a produção de prova testemunhal, já a requerida manifestou-se pelo julgamento antecipado da lide às fls. 2831.



Através da decisão de fls. 2836, verificou-se que a requerida especificou provas nos embargos apresentados, sendo deferida aprova testemunhas.



Na audiência de conciliação, instrução e julgamento (fls. 2847), tentou-se a conciliação, mas esta restou infrutífera, sendo ouvidas duas testemunhas arroladas pelo requerente.



Às fls. 2863/2866, informando que a requerida teve sua liquidação extrajudicial decretada.



A requerida manifestou-se às fls. 2872/2875, requerendo a gratuidade de justiça e a suspensão do feito.



Pela decisão de fls. 2888 foi indeferida suspensão do processo.



A carta precatória expedida para oitiva da testemunha arrolada pela requerida foi devolvida sem cumprimento, não havendo manifestação da requerida sobre a mesma – conforme certificado às fls. 28928.



Alegações finais da parte autora às fls. 2930/2936.



É o breve relato. DECIDO.



Inicialmente, declaro precluso o direito da requerida no que concerne à produção da prova testemunhal, porquanto apesar da vista aberta às partes para se manifestarem sobre o retorno da carta precatória não cumprida (para oitiva de sua testemunha), não se manifestou (fls. 2928) demonstrando, desta forma, seu desinteresse na produção da prova testemunhal.



De outro lado, afasto a preliminar de ausência de interesse de agir, na medida em que o autor apresentou na inicial o contrato de serviços efetuado com a requerida, bem como as notas de corretagem correspondentes às transações realizadas em seu nome, sendo estes documentos suficientes para a propositura desta ação monitória.



Senão vejamos:



“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO MONITÓRIA. NOTA DE CONTRATOS DE INTERMEDIAÇÃO. NOTAS DE CORRETAGEM. CONSTITUIÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO. POSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CABIMENTO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REQUISITOS AUSENTES. Os contratos que o investidor firma com a corretora de valores, autorizando-a a intermediar operações na Bolsa de Valores, acompanhado das notas de corretagem correspondentes às operações realizadas e do extrato de contas correntes, são documentos suficientes para a instrução do procedimento monitório. Como a definição de consumidor do CDC (art. 2º) o aponta como sendo toda pessoa, física ou jurídica, que adquire ou utiliza produtos ou serviços como destinatário final, esclarecendo que serviço é toda atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, exceto a trabalhista (art. 3º, § 2º), a corretagem pode dar ensejo à caracterização de uma relação de consumo, remunerada que é. Para aferição da existência de relação de consumo, deve-se observar se numa ponta está uma pessoa jurídica, cuja atividade de corretagem é desenvolvida com finalidade empresarial, tornando-a disponível no mercado de consumo, e na outra ponta, se existe a figura do consumidor, o que se dá quando a corretagem é contratada para aproveitamento do resultado para si próprio, como destinatário final. Para que seja invertido o ônus da prova, com fulcro na disposição do artigo 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, deve estar caracterizada pelo menos uma de duas situações: a verossimilhança das alegações do consumidor ou for ele hipossuficiente para prová-las, segundo as regras ordinárias de experiência (art. 6º, VIII, CDC)”.(TJMG – Rel. Des. LUIZ CARLOS GOMES DA MATA, nº do processo 1.0223.08.249276-8/001)


Preliminar rejeitada.



Afasto, também, a preliminar de inépcia da inicial porque o requerente discorreu, claramente, sobre os fatos e o direito da presente ação sendo seu pedido certo e determinado, o que possibilitou à requerida ampla contestação de todos os pedidos iniciais.



Leia-se:



“DIREITO PROCESSUAL. INÉPCIA DA INICIAL. INCORRÊNCIA. Nos termos do art. 282, incisos III e IV do Código de Processo Civil de 1973, a inicial deve conter os fatos e os fundamentos jurídicos do pedido e o pedido com suas especificações. As causas ensejadoras da inépcia da inicial devem ser analisadas sob o contexto do contraditório e da ampla defesa. Somente quando ausentes a clareza e a determinação do pedido há impossibilidade de defesa por ausência de conclusão lógica decorrente do narrado. Deve o julgador envidar todos os esforços para decidir integralmente o mérito da causa controvertida, visando à pacificação social.” (TJMG – Apelação Cível 1.0105.12.034871-6/001, Relator(a): Des.(a) Estevão Lucchesi , 14ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 26/01/2017, publicação da súmula em 03/02/2017).



Preliminares afastadas.



Noutro giro, a requerida não apresentou documentos contábeis que pudessem comprovar sua hipossuficiência financeira, razão pela qual indefiro o pedido de gratuidade de justiça (na medida em que liquidação judicial não é sinônimo de hipossuficiência financeira).



Trago o julgado sobre a matéria:


“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – SEGURADORA EM LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL – SUSPENSÃO DE PROCESSO DE CONHECIMENTO – IMPOSSIBILIDADE – JUROS – CORREÇÃO MONETÁRIA – AUSÊNCIA DE OMISSÃO E DE CONTRADIÇÃO – PEDIDO DE JUSTIÇA GRATUITA – PESSOA JURÍDICA. Em se tratando de ação de conhecimento, não há falar em suspensão do processo, em razão de ter sido decretada a liquidação extrajudicial de uma das partes, observado que, antes da constituição de título executivo, inexistem atos de constrição patrimonial a prejudicar ordem de preferência de credores. Correção monetária não traduz acréscimo, porque constitui simples mecanismo de manutenção do valor real, sendo vedada a suspensão ou interrupção de sua incidência em relação a crédito junto à entidade submetida a regime de liquidação extrajudicial. Constitui efeito da liquidação extrajudicial a suspensão da incidência de juros até a satisfação do passivo em liquidação, prestigiando-se a satisfação das obrigações principais da liquidanda. Diante de ausência de contradição e omissão no acórdão, fica configurado que a parte, na verdade, pretende a rediscussão da decisão, com o objetivo de modificá-la de modo a atender aos seus interesses, finalidade para a qual não se presta a via recursal eleita. O pedido de gratuidade judiciária formulado por pessoa jurídica depende da comprovação de efetiva necessidade do benefício, cuja ausência acarreta o indeferimento, independentemente de prévia intimação, quando não há, sequer, requerimento de produção de prova a respeito.” (TJMG – Embargos de Declaração-Cv 1.0024.12.283655-4/002, Relator(a): Des.(a) José Augusto Lourenço dos Santos , 12ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 14/12/2016, publicação da súmula em 24/01/2017) – g.n.



Outrossim, dúvidas inexistem de que no presente caso incidem as regras do CDC, porque de acordo com o artigo 1º, §1º, III, da Lei Complementar nº105/2001, as corretoras de câmbio e valores mobiliários são consideradas instituições financeiras e, por isso, estão submetidas às regras estabelecidas no Código de Defesa do Consumidor (artigo 3º, §2º, CDC e súmula 297 do STJ).



Dentre os direitos básicos do consumidor está o de inversão do ônus de prova, como dispõe o inciso VIII, do artigo 6º, do CDC.


Contudo, não verifico nos autos a hipossuficiência do autor/consumidor na relação de consumo, porquanto produziu as provas documental e testemunhal, que se mostram suficientes para o deslinde da causa.



Assim, indefiro a inversão do ônus da prova.


A par disso, entendo que os pedidos iniciais procedem parcialmente.



Isso porque, restaram comprovados os erros efetuados pela requerida, através de seus prepostos, quando da realização de operações não autorizadas pelo requerente, tornando-as, pois, irregulares.



As provas documental e testemunhal convergem nesse sentido.



Vejamos (sic):


“(…) Bernardo,



Hoje envolvi a diretoria da corval para avaliação do seu caso.



Certamente tomarei as medidas cabíveis e acertar a situação e emitir o contrato de ressarcimento de pardas que negociamos. E todo prejuízo provocado pelo mal atendimento da corval será honrado no acoro de ressarcimento das perdas de sua conta corrente.


Lamento muito a postura da dupla jp e mercio. Me parece q eles não jogam no tima de nossa parceria corval e Bernardo. Ainda essa semana quero ir até você a fim de formatar a solução.


Um abraço.


Guilherme Mendes Franco” – e-mail de fls. 1645.

“(…) Be,


Você quem manda.

Novamente afirmo que a CORVAL irá promover ressarcimento integral das perdas derivadas de todos os erros operacionais produzidos pelo João Pedro.



(…)


Abs

Guilherme Mendes Franco” – e-mail de fls. 1650.



“(…) que o autor operava pela empresa Corval através do telefone e “mensanger”, que por isso quer dizer que é preciso ter um funcionário da Corval, operador, para executar as obras; que o autor impunha as operações um limite de quantidade, ou seja, número de ações e, também, a operação tinha que ser travada que quer dizer segurança; que a trava é uma segurança feita pelo investidor em que o mesmo coloca um limite que ele estaria aceitando perder, se a operação der errado; que mesmo com o limite imposto pelo investidor referente à trava, o operador não poderá continuar operando sem ordem do investidor; sendo que com ordem do investidor mesmo com a trava poderá o operador continuar operando na Bolsa de Valores; que as autorizações do investidor podem ser feitas por telefone e-mail ou mensagens,as tem que ter o registo da ordem; que substituiu um operador na empresa corval; que esse operador que o depoente substitui teria realizado operação irregular, que não sabe identificar as operações irregulares, mas ficou sabendo que foram várias; que Guilherme Mendes era diretor da Corval; que o depoente chegou a perguntar a ele sobre situação ao autor; tendo o Guilherme dito que já havia conversado com o autor e ele seria ressarcido; que não participou da reunião entre Guilherme e o autor. (…) que não sabe bem a data, mas acha que foi agosto de 2012 a julho de 2013 o período em que trabalhou na Corval; que quando começou a trabalhar na Corval o autor já tinha carteira de investimentos na Corval; que o autor permaneceu investindo na Corval até o Depoente sair; que o depoente se recorda que a Corval contratou uma empresa para fazer o levantamento dos prejuízos sofridos pleo autor; que não sabe dizer o período em que ocorreram os prejuízos, mas foi no período em que ele investia na Corval; que ficou sabendo dos prejuízos sofridos pelo autor mas não estava presente; que um investidor pode operar na bolsa pelo sistema “Home Broker”; que a pessoa precisa de um computador e a permissão da corretora para que ele opere via “home broker”, que o autor fazia operações travadas e financiadas e por isso era considerado o seu perfil de investidor moderado; que o autor investia no “day trade”; (…)” – depoimento prestado por Sandro Augusto Silva às fls. 2848/2851.


Nesse quadrante, entendo que não há falar em falsidade dos e-mails apresentados pelo requerente, na medida em que deveria a requerida ter efetuado prova de que seu diretor Guilherme não seria o emissor das mensagens eletrônicas ou mesmo que estas foram adulteradas. No entanto, assim não procedeu, ficando somente no campo das alegações, o que não se admite.


De se registrar, que ser ou não o requerente um investidor agressivo (ou moderador) e mesmo existindo a possibilidade do “home broker”, não altera a identificação (ilicitude) das irregularidades nas operações efetuadas pelo preposto da requerida, sendo oportuno frisar que os ganhos e as perdas são da essência do negócio envolvendo o mercado financeiro; contudo, não se pode ter o mesmo entendimento no que concerne às falhas constatadas.



Friso que ouvi a mídia de fls. 1740 verificando, apenas, tratativas relativas às operações no mercado financeiro entre o autor e o operador João citando (exemplo gravação nº 20100915-2904-128457888855871) e, também, com Guilherme (na gravação nº 20100917-2904-1298474680859751, na qual também é citado um problema com a bolsa).



Também da análise dos documentos de fls. 1779/2077 verifica-se somente informações cotidianas sobre operações do mercado, ou seja, conversas entre o requerente e os prepostos da requerida.


Ora, o cerne da lide não são as operações corretamente realizadas, mas sim os erros operacionais constatados.



Noutro giro, da leitura do contrato firmado pelas partes não verifiquei cláusula que obrigasse ao requerente pleitear o que entende devido junto à BM&F Bovespa como pré-requisito para que ingressasse em juízo requerendo o que de direito.



É prerrogativa do requerente propor ou não reclamação perante a BM&F Bovespa.



Induvidoso, portanto, o ilícito contratual praticado pela ré, através de seu operador, sendo de rigor a procedência do pedido de restituição do valor de R$1.283.984,60 (um milhão, duzentos e oitenta e três mil, novecentos e oitenta e quatro reais e sessenta centavos).



Também deve ser ressarcida a quantia de R$20.664,50 (vinte mil, seiscentos e sessenta e quatro reais e cinquenta centavos), já que o requerente não deu causa ao saldo negativo de sua conta para que lhe fossem cobrados valores sob a rubrica “despesas financeiras sobre ressarcimentos atrasados”.


Noutro giro, quanto ao pedido de ressarcimento do valor de R$120.000,00 (cento e vinte mil reais) a título de imposto de renda, entendo que razão não assiste ao autor.



É que, é obrigação de todo cliente o recolhimento de imposto de renda sobre o ganho de capital com operações que gerem lucro no mercado financeiro.


Entretanto, da análise dos documentos do anexo VI (fls. 1495/1608), na rubrica “Ganhos e Perdas”, extrai-se a informação de que não houve ganho, assim, não se recolhe imposto de renda sobre o prejuízo, ou seja, somente se recolhe imposto de renda quando a operação gera lucro.



Cumpre salientar que o requerente não trouxe aos autos suas declarações de renda nas quais, em princípio, constariam os pagamentos da quantia de R$120.000,00 (cento e vinte mil reais) a título de imposto de renda.



Não há prova de que tenha o requerente recolhido este valor à Receita Federal.


Assim, neste ponto o requerente não se desincumbiu do ônus probatório constante do artigo 373, I do CPC/15.



Sobre o ônus da prova, destaca-se a seguinte lição doutrinária (sic):



“A doutrina do ônus da prova repousa no princípio de que, visando a sua vitória da causa, cabe à parte o encargo de produzir provas capazes de formar, em seu favor, a convicção do juiz. O fundamento da repartição do ônus da prova entre as partes é, além de uma razão de oportunidade e de experiência, a idéia de eqüidade resultante da consideração de que, litigando as partes e devendo conceder-se-lhes a palavra igualmente para o ataque e a defesa, é justo não impor só a uma o ônus da prova. Tão-só depois de produzidas ou não as provas e de examinadas todas as circunstâncias de fato é que o juiz recebe da lei o critério que há de plasmar o conteúdo de sua decisão” (Alexandre de Paula – in “Código de Processo Civil Anotado” – 6ª edição, vol. II, p.1417).



Por fim, não há falar em condenação do requerente nas penas da litigância de má-fé, porque restou comprovada a ilicitude contratual por parte da requerida, não havendo falar em alteração da verdade dos fatos por parte de Bernardo.



Diante do exposto, julgo parcialmente procedente o pedido formulado por B.V.C.O. contra Corval Corretora de Valores S/A nos autos da presente ação, para constituir de pleno direito o título judicial e com o reconhecimento da obrigação de pagar a quantia de R$1.304.641,10 (um milhão, trezentos e quatro mil, seiscentos e quarenta e um reais e dez centavos – soma dos itens 6 e 7 da inicial), devendo incidir sobre tal valor correção monetária pelos índices da Corregedoria de Justiça e juros de mora de 1% ao mês, ambos a partir da citação até efetivo, nos termos da fundamentação supra.



Fixo os honorários advocatícios em 10% sobre o valor da condenação.



Condeno o requerente no pagamento de 30% (trinta por cento) das custas/despesas processuais e honorários advocatícios sucumbencias e condeno a parte requerida no pagamento de 70% (setenta por cento) das custas/despesas processuais e honorários advocatícios sucumbencias.



P.R.I.

Belo Horizonte, 15 de março de 2017.

Cláudia Aparecida Coimbra Alves

Juíza de Direito

 


 

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